31.5.14
Com este botão acaba
tudo
Mas por que eu tô pensando nele?
Ele morreu. Ou devia ter morrido. Pelo menos na minha
cabeça.
Esse outro é muito curto. Maldita família conservadora desse
coxinha.
Se fosse a dele, não tava nem aí. Até porque o filho da puta
mal tinha família. Um verdadeiro fudido. A única coisa que herdou foi milhões de
genes da desgraça de um casamento torto.
Por que o amava tanto? Amava?
Detesto este. Muito apertado. Toneladas de sibutramina durante
meses e só três quilos de banha perdidos. Seria o comentário geral daquela
parentada sem fim.
Vale esse sacrifício todo pra casar com isso???
Se fosse o outro, a esta hora estaríamos bebendo e fazendo
piada com os convidados. O infeliz me divertia.
Aquele tá comprido demais. A cauda daria voltas no
quarteirão.
E o curtinho que ressalta os peitos?
Haja peito para casar hoje.
Trocentos vestidos e nenhuma certeza.
E ele? Vai pra igreja ver meu casamento?
Dá tempo de experimentar outros?
Ou com este botão acaba tudo?
17.5.14
Autógrafo sem data
No
final do autógrafo, o velho pede – grita − pro escritor não pôr a data. E
sai arrastando a perna bem devagar.
Mas tem que ir mais rápido.
Precisa ser rápido. A perna não deixa, não quer, não vai. A rua, reta pra
todos, pra ele inclinada e afrontosa. Não tem tempo a perder. “O metrô não fecha
à meia-noite?”. São dez e meia ainda. “Tenho tempo de sobra.”
Não. Não tem. Há os
malditos degraus. A ida até a bilheteria. A moça que vai perguntar algo que ele
não ouve direito. A catraca que nunca libera o cartão de primeira.
“E se eu tivesse
furado a fila? Velhos não podem furar a fila? Dizer qualquer merda e querer ser
atendido primeiro?” Todos esperam que um velho (“eu?”) faça ou diga alguma merda.
Como essa besteira de pedir (“EU GRITEI?”) pra não pôr a data.
Pra que isso? Vai vender
o livro depois? Leiloar se o escritor morrer?
“Sim, vou ganhar uma
boa grana. Se eu não fosse morrer primeiro.”
Acerto errado