18.1.07

 
O prelúdio do dilúvio

A noite chora. Prenunciando que essa gotinha tão pequena que escorre devagar dos seus olhos não será a última, mas apenas a primeira de muitas outras que virão e verão a crise intensificar-se muito mais. Mais como? E possível mais? Sim, é possível. Basta ver que no fundo do poço já racham rachaduras que o conduzirão prum poço mais fundo. É possível ir mais fundo? Claro. Tão claro como esta noite de chuvinha rala como sua lágrima, mas que vai se infiltrando no barro dos bairros de periferias cujas encostas não são guardadas nem pelos seus guarda-costas, e desabando telhados, quartos, sonos e sonhos de adultos e crianças que não choram como você, mas chorarão a vida inteira por não terem mais parentes pra salvar-lhes de outras chuvas que despejarão gotas bem mais verdadeiras que sua lagrimazinha e os despejarão de novo. E você, reclamando do barulho da tempestade que agora aumentou, tomando Lexotan pra poder dormir e se achando a pessoa mais infeliz do mundo.

Comments:
Eu queria chorar mas não consiguia. A pílula secou minhas lágrimas e colocou no meu rosto um sorriso vazio e idiota. Eu cheguei ao ponto de me cortar, me queimar com o isqueiro, sentir dor para derramar uma lágrima. Mas será o Benedito que não posso sequer chorar ???

- Não, ainda não.

Responde friamente meu psiquiatra.
 
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