29.8.11
Vida encapsulada
─ Cento e vinte?!
─ É.
─ Não é muita coisa pra engolir?
─ Tô pagando; faça se quiser.
─ Só mil e quinhentos dólares?
─ Se não tá a fim, não embaça; tem um monte de gente que topa.
─ E se uma delas estourar?
─ É a minha paciência que tá estourando.
─ Mas daí eu vou morrer!
─ É um risco que se corre.
─ Posso checar uma por uma?
─ Não, já conferi. E não é nem pela sua vida. É pela grana que vou perder se você morrer.
17.8.11
UFC no metrô
Nos horários de pico, o metrô de São Paulo galgou um nível tão elevado no transporte de “pessoas” que é difícil de classificá-lo.
Os sadomasoquistas o chamariam, entre uivos de gozo, de paraíso (muitos já estão na estação Paraíso mesmo).
Os antropólogos, de ritual de acasalamento da massa.
Os juristas usariam massa falida, apontando que os réus mal têm espaço de dar ré com o corpo.
Os economistas diriam que a inflação de pessoas gerou um déficit de trens e que o déficit de trens venho da inflação de pessoas.
Os políticos o classificariam de ótimo e que outras “ótimas” estações estão a caminho; a caminho de suas promessas serem esquecidas pela população.
As crianças o chamariam de brincadeira (de muito mau gosto).
Os mágicos, sem sombra de dúvida (nem pras sombras há espaço), que ele é o fim de carreira (sair do fundo do mar acorrentado é fácil; já sair do metrô...).
Mas o melhor termo seria o dos lutadores, que, como o povo, ganham a vida batalhando: Ultimate Fighting Championship.
12.8.11
Procura(dor)ia
Andando-procurando pelas ruas-vi-elas da Liberdade quase Sé-quase centro-quase livre-camiquase, não tem ali-aqui-lá muito menos, andando, por que é tão difícil? na rua dos Estudantes estuda o plano B, A foi reprovado faz tempo, pensa num C-D-E... pára no X, e depois do Z, qual a saída? por que entrou nesta? pra que andar tanto, tonto, tantas, tantã, tantra passeando em sua mente-sã-corpo-sal de chagas chatas – CHEGA! – sem nada conseguir? mas continua, é importante pró-seguir, precisa, deve, teme-treme, e sebo-ebô nas canelas que chá de canela-homeopatia-nem-homem-pra-tia resolve ficar pra tio, reandando passa pela Procuradoria, bens do patrimônio, mas o que tinha? era seu? era bem? bom? crescei e multiplicai-dividir com quem a soma desse fardo que o subtrai pequeno ante o altar da catedral-mor ajo-elhado-errado já na Sé?
sem sentido, sentimento, centímetro de culpa por coisa tão transviada de vida ida sem revolta?
NÃO!
pára,
louco pra desencontrar o que se encontrava em si.
Minifato XXX
(a realidade goleando a ficção)
Estudante de 11 anos foi agredido por 14 colegas em Juazeiro (BA).
Nome do colégio: Polivalente.
‘PoliVALENTE’.
A pedido da namorada, homem foi tentar pegar uma orquídea rara em um penhasco no Vale da Pirambeira, no Paraná, escorregou de uma ribanceira e morreu.
Mãe de uma das “meninas do arrastão” da Vila Mariana, na cidade de São Paulo, diz pra filha que ela “é uma besta” por voltar ao local do crime; não se sabe se a mãe voltou a cuidar do seu crime, ou melhor, da menina.
Oito dias após se casar no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (SP), Rosycler Neves, 61, morreu.
Mesmo com a doença degenerativa neurológica dela, que a impedia de andar e falar, Luis Nogueira, 42, fez questão de cumprir a promessa e se casar com ela. Nogueira diz que quando era jovem a tinha pedido em casamento, mas ela se recusou por ele ser “moleque”.
6.8.11
Programa de índio
(ou Quase um Minifato)
Irmãos – o Xingu dos Villas-Bôas.
Um baita exemplo de exposição.
E de vida.
Incrível como eles dedicaram e arriscaram a própria vida em defesa dos índios.
Vários murais, painéis, filmes, objetos pessoais e históricos e uma ampla amostra de utensílios indígenas.
Vale muito a pena o passeio.
Tudo certo, se não fosse o final.
Se não fossem elas...
As facas.
Muitas.
Dezenas.
Grandes.
Suficientes pra...
Presas por raquíticos barbantes.
Estranha-as.
Olha-as com atenção.
Com interesse.
Com desejo.
Com medo.
Consternado.
Diversas facas.
Pra que tantas?
Quem exagerou assim?
Perigo isso.
Vira-se pra ver se há alguém por perto.
NÃO!
Perigoso deixá-las aqui.
Assim.
À mão.
Todos os monitores longe.
Se fosse o chefe, mandava alguém ficar ali o tempo todo.
Mas não é o chefe.
Nem ninguém.
As facas reafirmam isso.
Na saída, pergunta se eles não têm medo que alguém se machuque com as facas.
Na verdade, queria mesmo é saber se não temem que alguém se machuque pro-fun-da-men-te com elas.
3.8.11
Minifato XXIX
(a realidade goleando a ficção)
A Missão
(ou Quase um Miniconto)
"Qual é a sua missão?"
"Revelar e cobrar a verdade", respondeu Estamira, catadora de lixo.
E ao questionar o diretor se ele sabia qual era a dele, antes de ouvir a resposta, ela disse: "A sua missão é revelar a minha missão".
Ao ouvir isso, Marcos Prado decidiu rodar o filme (www.estamira.com.br).
Estamira Gomes de Sousa, falecida no dia 28.07.2011, também foi retratada no miniconto “Ex-tamira”: http://miniconto.blogspot.com/2006_10_01_archive.html