30.1.12
Palace 3
Como predito, nossos prédios já nascem predispostos ao
fracasso.
Do alto dos seus engenhos (senhores de engenho), eles tendem
ao chão nas suas ânsias sãs de voltarem ao pó, verterem lágrimas e concretarem
destinos.
São arranha-céus feitos por engenheiros-dinheiros que arranham
vidas, arruínam pessoas e ruminam futuros.
Feitos de concreto, quedam-se virtuais na sua segurança
debilitada, no seu desabite-se e na sua propina fundadora.
Travestidos de palacetes, empalam-nos e palafitam-se ao
vento de assopros fiscais, prefeituras desedificantes e governos desgovernados.
Ao construí-los, destruímos este país que desde cedo cedeu
sua sede aos que têm sede de poder.
Ao destruí-los, construímos nossas covas rasas de corpos
cheios de entulhos.
Ao reconstruí-los, refundamos nossa obra de dejetos a céu
aberto.
26.1.12
Buquê SP
São Paulo é um graveto transformado num buquê.
24.1.12
Titanic mon amour
A bombordo, só ficaram bons moços transbordados de bons
modos.
A estibordo, só restaram os que tinham medo encharcado de
frágil.
À frente, um capitão que deu pra trás.
E que não sou eu nem nunca fui.
Por mais que minhas roupas impecáveis brancas bancassem, que
as insígnias sem sentido significassem e que toda a tripulação fosse tripudiada
por mim.
Não.
Não sou capitão, nem comandante, nem marujo sujo de
consciência limpa.
Minha missão naquele navio não era dar o bote a todos, mas dar
o bote na primeira oportunidade.
E ser o último a sair só nos sonhos daqueles que nunca
tiveram a vida naufragada pelos mares salgados e negros da realidade.
Muito menos dar lição de moral em capitanias de portos
chafurdados por porcos ansiosos em se tornarem heróis.
O “Vá a bordo” não era uma ordem acertada pra ser dada nessa
desordem do mundo.
Mas também não sou esse Schettino covarde que essa mídia de
merda moldou.
Sou só um mero ex-cretino.
8.1.12
Cracrolândia espalhada
Espalhar o medo.
Espelhar os mortos.
Zumbizar os vivos.
Não foi isso que vocês pediram?
Queriam?
Imploravam?
Devolver a cidade e a felicidade aos cidadãos?
Exterminar esses zumbis que resistiam e insistiam em existir e enfear nossa metrópole?
Que vagavam e vagabundavam suas ancas e pelancas naquele centro de Novas Luzes de vidas apagadas por cachimbos acesos e acessos restritos?
Que davam o próprio corpo roto feito ratos esgotados no esgoto em troca de um crack-pedra em nosso sapato?
Nós fizemos.
Se usamos psicologia, assistência social, filantropia, fisiologia eleitoral ou porrada na cabeça, não faz diferença.
Se Higienópolis agora está infestada e enfezada por abrigar e brigar com os restos desses trapos vestidos de desumanos, não é nossa culpa.
Nossa missão é manter a cidade limpa.
Nem que pra isso tenhamos que esconder a sujeira debaixo de viadutos e vias sem vista e sem saída.
Por isso, ao encontrarem um deles, não se assustem.
Nós espalhamos a morte pra não empalhar a vida.