6.9.18
O prédio ainda estava
de pé
Ao projetar nossas carcaças, o prédio que ardia em chamas
nos chamava para queimar com ele.
De todas as memórias que ele guardava, e nossa ingenuidade
cria que ele as guardasse mesmo, a do fogo consumindo suas entranhas hoje soa a
menos estranha.
Agora sabemos ser normal que tenha sido assim, e um tanto
anormal haver demorado séculos para isso acontecer diante do combustível
altamente inflável que somos.
Ele – que hoje mata nossas zumbis esperanças já cansadas de
renascer das cinzas com cores cada vez mais pálidas – podia sobreviver a tudo,
menos a nós.
Queimá-lo, involuntariamente ou não, é o que apaga a
vergonha que incinera em nós tudo aquilo que nunca fomos e jamais seremos.
Vê-lo ainda de pé é um troféu a celebrar o fracasso de haver
nos tornado o museu do descaso e os campeões de dar passos para o futuro com
eternos pontapés no passado.
Tê-lo ainda de pé é o que congela em nós a sina de sermos a
chama eterna desse farto fogo-fátuo.