29.6.10

 
A cor do derramamento


Laranja-explosão, cinza-fumaça, mar negro, viúvas de luto, pelicanos marrons, tartarugas pretas, manchetes vermelho-gritantes ou mesmo a baba incolor da espumante raiva dos congressistas americanos.

Danem-se todos os ecochatos irritadinhos com essas cores!

Pra mim, a única que estraga meu dia é a dos painéis que mostram a ação da minha empresa despencando. É a do gráfico-bigorna apontando perdas superiores a 50%. E, acima de tudo, a dos milhões de bônus que receberia a mais caso esse “acaso” não tivesse ocorrido.

Sim, porque como poderíamos prever tamanha tragédia? Como sermos julgados responsáveis por uma falha que poderia ter acontecido com qualquer empresa?

Economizamos um milhão ou dois aqui ou ali? Eu sei. Ignoramos relatórios de engenheirozinhos juniores loucos pra serem promovidos? Certo. Não atentamos às tentações de descumprir prazos pra antever lucros? Verdade.

Mas, do fundo do meu coração (sim, eu tenho), a única cor que me faz falta é a da Côte d’Azur.

20.6.10

 
So(i)sLaio


Que outro caminho seguir se não consegues desviar a vista da tua sina?

Como podes desejar outra sorte senão a que te espera em tortuosa linha reta?

Se, de soslaio, vês obliquamente as mesmas vias que não vias? Se a diante tens só a meia lua que rapidamente cai prenunciando um crepúsculo antecipado de ti? Se aniversarias germinando o presente cujo germe roubará teu futuro? Dize como, como, como fugir?

Não!!!

Deverias já saber. Qual clarão que se apaga nesta noite tão fria, lampejas o flash do que ficará retratado na memória de todos que brevemente te esquecerão (na muito improvável hipótese de terem lembrado um dia...).

Esperavas mais? Que soberba. Esperançavas ainda?? Que tolice! Esperneavas bravamente??? Que barata bravata!!!

Sim! Dirija-te logo ao começo do teu fim. Digira-te a ti próprio. Engula a gula de tua voracidade. Preste mais atenção em tua peste!

Em teu duplo unificado e mortificado, sois só e sois só o Laio de ti.

15.6.10

 
Defesa imundológica


Tenho em mim meu antieu.

Um gene gênio que destrói seus gêmeos com a burrice de quem declara uma guerra a si.

Nessa guerra bastarda que nunca se basta, a luta de cada hora é só uma trincheira da batalha diária que antecede o holocausto semanal de meses eternos. Entre mortos e feridos, ressuscita diariamente algo que já não se classifica e não vê sentido em acordar e enfrentar a rotina de rota tão autodestruidora.

Perdido num campo minado em que há mais bombas que terra, até já se resigna de sofrer cada pequena dor, que é quase anulada pela seguinte, a qual traz consigo uma próxima acompanhada da posterior.

O que resta do ataque constante dessa defesa imundológica, de poderio desigual e com a lógica perversa do avesso, é nocauteado por drogas que não curam a causa, não aliviam os efeitos, arruínam o que mal sobrevivia e cansam mais do que esperançam.

Na luta contra mim, me venci me derrotando.

8.6.10

 
A falsa tranquilidade da chama da vela enquanto o Vento não vem


Bruma tropeça na internet numa receita da Ana Maria Braga e, perdida entre ovos, açúcar, claras em neve e lágrimas, se vê fazendo o que nunca pensou: algo indicado por aquela mulher. “A que ponto cheguei.”

Desconjuntado ─ “nada vindo daquela mulher podia dar certo” ─, o bolo toma fartas pazadas de cobertura de latinha. Quase uma argamassa a unir a estrutura tão frágil quanto ela.

Rebocada, a obra ganha uma vela de cinco enorme; visão que a faz esboçar o primeiro sorriso do mês.

Enquanto espera (“aniversário de quando se conheceram, véspera do Dia dos Namorados; é claro que ele vem”), se pergunta onde errou.

Acende a vela se questionando se o recheio tá muito doce. Se fora demais doce com ele. “Homem odeia mulher que se entrega toda.” Se devia ter dado só uma fatia de si.

A chama responde com tímidos balançares, difíceis de traduzir.

Duas horas já de atraso; abre a janela querendo ar e menos angustia.

A chama trepida mais.

1.6.10

 
Supra-sumo


Do ultranada.

This page is powered by Blogger. Isn't yours?